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Por Francisco Camargo*
 
Vender para o governo não parece ser tão difícil. Se o produto é bom, a reputação da empresa é boa e os preços são excelentes, não parece haver grandes entraves. Vencida a concorrência pública, tudo parece perfeito até a hora de assinar o contrato e descobrir que os governos também querem ser financiados por prazos de 30, 60, 90 ou mesmo 360 dias.
 
Neste momento, as MPME (micro, pequenas e médias empresas) descobrem que irão precisar de capital de giro para financiar a venda. No Brasil, o instrumento mais usado para financiar as vendas entre empresas privadas é o Desconto de Duplicatas, que são sacadas (essa é a terminologia bancária) contra o comprador (o sacado) pelo vendedor (cedente), desde que a transação se realize entre empresas privadas.
 
Essas duplicatas são emitidas a partir de um lastro: a venda realizada. Para todos os fins, representam a mercadoria/serviço entregues ao comprador. Com essas duplicatas em mãos, o vendedor vai às instituições financeiras e as cede ao Banco para serem descontadas. Recebe à vista, descontados os juros incidentes sobre o prazo da venda. O sacado paga diretamente ao banco que descontou as duplicatas: fim da transação. 
 
Todas as instituições financeiras consideram as duplicatas de venda mercantil uma excelente garantia para o financiamento dos vendedores (cedentes).
 
Mas se entre empresas o financiamento das vendas é um processo muito antigo e azeitado, para o governo isso muda radicalmente. Com 85% do quadro associativo constituído por MPME’s – certamente o grosso dos empregos do setor e todas as startups – a ABES (Associação Brasileira das Empresas de Software) tem trabalhado há quase três anos por mudanças no processo que possibilitem às MPME concorrerem em regime de igualdade com as grandes empresas.
 
Na venda de tecnologia da informação – principal objeto dos associados da ABES para governos – a exigência do financiamento para governos tira as MPME desse tipo de venda. Mesmo que o governo queira utilizar o papel indutor das compras públicas, as MPME não conseguirão aproveitá-lo.
 
De nada adianta a vantagem de poder fazer preços até 5% maiores em concorrências públicas, quando se é uma microempresa, pois o problema não é esse: as MPME’s podem até ganhar a concorrência pública, mas em seguida defrontam-se com a dura realidade brasileira, os governos, também, se financiam em fornecedores: https://portalnovarejo.com.br/2017/06/fornecedores-emprestimo/.
 
 
Segundo o artigo 58 da Lei nº 4.320/64, “O empenho de despesa é o ato emanado de autoridade competente que cria para o Estado obrigação de pagamento pendente ou não de implemento de condição”. Com o empenho, o governo reconhece uma obrigação de pagar. Diferente das vendas entre empresas, quando se vende para o governo, nenhum papel é emitido, ou melhor, existe o “empenho” que não é bem um papel emitido a partir do lastro de uma venda mercantil, como no caso das duplicatas entre empresas. 
 
A empresa vencedora da licitação vê-se em uma situação difícil: ganhou a concorrência e não consegue capital de giro ou mesmo dar garantias para que seus fornecedores a financiem para efetuar a venda.
 
O que a ABES tem sugerido ao governo federal é que o governo transforme a venda para o governo, o contrato de compra e venda e o empenho de despesa em um lastro para venda mercantil, com a possiblidade da emissão de um “papel comercial”, endossável e com liquidez.
 
Seria um tipo de e-Gov-Compra-Confirmada, em que o vendedor recebesse esse “papel mercantil” que poderia ser descontado, cedido, dado em garantia, como se duplicata fosse.
 
Tornaria as vendas para governo mais igualitárias, permitindo a participação de mais empresas nas concorrências públicas e eventual redução de custos.
 
Todo o ciclo de compra/venda seria controlado pelos sistemas de governo, que saberia a cada momento o que aconteceu com seus e-Gov-Compra-Confirmada.
 
Seria uma verdadeira revolução nas compras públicas e na imagem do governo. Evidente que tudo seria digital, com assinatura digital por e-CNPF ou e-CNPJ.
 
 
* Francisco Camargo, engenheiro de Produção pela Escola Politécnica da USP, Empresário, fundador do Grupo CLM, é presidente do Conselho Deliberativo da ABES 
 

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