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Por Cassio Dreyfuss, vice-presidente de Pesquisas do Gartner

 

Todo mundo que já desenvolveu soluções em TI conhece o problema. Durante décadas, as organizações usaram os mesmos processos, metodologias e governança para desenvolver todas as classes de soluções, das mais triviais às mais complexas, daquelas que demandam respostas urgentes àquelas que só podem ser desenvolvidas através de planos de longo prazo. Todo mundo sabe que, quaisquer que sejam os processos, as metodologias e a governança, o “tamanho único” definitivamente não serve para todas as soluções.
 
No entanto, apenas recentemente apareceu uma solução. O Gartner propôs a “TI bimodal”, ou seja, implementar duas abordagens distintas para o desenvolvimento de soluções – que, por absoluta falta de marketing, foram chamadas, sem qualquer originalidade, “Modo1” e “Modo 2”. O Gartner caracteriza o novo Modo 2 de uma maneira bastante distinta do tradicional Modo 1 e as empresas devem escolher cuidadosamente a abordagem adequada para cada iniciativa.
 
Um verdadeiro ovo de Colombo. Primeiro, porque a ideia é óbvia em sua simplicidade; depois, porque a sua implementação, como as expedições do navegador, não tem nada de simples – e muito menos de marketing.
 
As empresas muitas vezes não são precisas em relação às suas expectativas para um Modo 2. Numa ponta do espectro, as empresas não dedicam a atenção e o cuidado necessários à implementação dessa nova abordagem. Por exemplo, as empresas muitas vezes pensam que porque usam metodologias ágeis já têm um Modo 2. Não têm, o Modo 1 também usa essas metodologias. O Modo 2 é muito mais que isso. É uma solução organizacional completa, que apresenta uma combinação inédita de diferentes características, e precisa ocupar um “espaço novo” na organização existente, afetando-a grandemente em vários aspectos (especialmente a área de desenvolvimento Modo 1). No outro extremo, as empresas esperam que essa abordagem seja a chave para o desenvolvimento dos seus novos modelos de negócios digitais. Não é. Uma TI Modo 2 é um componente importante nesse desenvolvimento, mas é apenas uma abordagem para desenvolvimento de soluções, não é uma estratégia.
 
Temos escrito bastante sobre o tema, caracterizando a diferença entre as duas abordagens (veja um resumo na tabela abaixo). Modo 1 é a abordagem tradicional, que todas as empresas usam. Ela é apropriada para soluções evolutivas e previsíveis, muitas vezes desenvolvidas por fases planejadas que se estendem no tempo. Ela visa atingir a excelência da solução. Exemplos típicos são encontrados em empresas de manufatura industrial ou de utilidades, onde o Modo 1 satisfaz a maioria das necessidades (senão todas). Modo 2, ao contrário, deve ser a abordagem escolhida para atender com agilidade e flexibilidade muitas necessidades (mas não todas) de ambientes instáveis e turbulentos, com baixo grau de previsibilidade. A abordagem visa alavancar a oportunidade da solução. Exemplos típicos estão no mercado financeiro, de seguros ou de varejo.
Abordagens Distintas para Soluções
 
Variável Modo 1 Modo 2
Ambiente Estável, progresso previsível Dinâmico, “explosões” criativas
Metodologia Desenvolvimento planejado e estruturado Prototipação ágil, em ciclos de aperfeiçoamento
Equipe Equipes de técnicos com atribuições formais a partir de requisitos Equipes multidisciplinares em colaboração dinâmica
Processo Formal, atribuição formal de tarefas, metodologias voltadas a prescrição e controle Atribuição formal de responsabilidades, liderança contextual, monitoração constante
Parceiros Tradicionais Inovadores, “digitais”
Governança Estrita, baseada em regras Mais leve, “bom-que-chegue”, baseada em papeis
 
 
 
Há cinquenta anos, a organização de TI tem a mesma estrutura. Não importam os nomes sofisticados de hoje; se arrancarmos os “post-its”, por baixo estarão as mesmas caixinhas: Desenvolvimento, Operação e Suporte. Em anos recentes, temos visto a fragmentação da organização de TI em vários componentes, com o objetivo de otimizar cada um de acordo com um objetivo específico. Por exemplo, aquilo que foi atribuição de um líder de projeto no passado – coleta de requisitos, desenho da solução e desenvolvimento – é agora atribuição de três papeis organizacionais diferentes: líder de relacionamento com o negócio (“business relationship manager”, ou BRM), arquitetura de aplicações e, finalmente, líder de projeto.
 
Pois a TI bimodal caminha exatamente nessa direção. Reconhecendo que diferentes soluções devem ser abordadas de maneira diferente, propõe o desenvolvimento de soluções de duas diferentes maneiras. Enquanto no Modo 1 o desenvolvimento ocorre em etapas sequenciais (coleta de requisitos, desenho de solução e desenvolvimento), no Modo 2 as coisas acontecem iterativamente (ciclos de aperfeiçoamento) e interativamente (grupos multidisciplinares em colaboração dinâmica). No Modo 1, os objetivos são aderência das soluções a expectativas estabelecidas das áreas de negócio, otimização no uso de tecnologias e produtividade das equipes. No modo 2, os objetivos são criatividade e experimentação nas soluções, inovação nos negócios com aplicação inédita de tecnologias e resposta rápida a uma demanda ou uma oportunidade de mercado, muitas vezes pouco definidas.
 
Mas se as soluções são sempre diferentes, por que não nos afastamos radicalmente do “tamanho único” e definimos abordagens diferentes para cada iniciativa, criando na verdade a “TI multimodal”? Projetos grandes e complexos em qualquer área (pense, por exemplo, no telescópio espacial Hubble) são sempre tratados como empreendimentos únicos, mas isso não seria prático nem econômico em empresas, implicando em custos e complexidade de gestão desnecessários. Entretanto, existem empresas que já trabalham com a “TI trimodal”: desenvolvimento de grandes projetos por fases, melhorias através de “releases mensais” programados (o que seria um “Modo 1,5”) e oportunidades dinâmicas. Para essas empresas, o valor para o negócio com essas três classes de solução compensa o custo e a complexidade adicionais.
 
Para a grande maioria das empresas, a classificação das oportunidades em duas classes de solução é o equilíbrio adequado entre eficácia das soluções contra a complexidade adicional de governança, integração e custo. O importante é ter muito claros os objetivos que queremos atingir com a fragmentação do desenvolvimento em duas classes de solução, avaliar criteriosamente o respectivo caso de negócios e implementar o modo adicional de solução com foco e disciplina – o que nos leva, finalmente, ao fator liderança. A criação de um Modo 2 é uma mudança organizacional. O sucesso de um empreendimento em direção ao novo depende de um líder que cria uma visão, compartilha essa visão com as equipes e as motiva a colaborar e enfrentar os riscos para atingir o objetivo pretendido. O sabor do sucesso é a melhor recompensa.

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