Por Cassio Dreyfuss, vice-presidente de Pesquisas do Gartner
A vida útil da maioria dos novos modelos de negócio é muito mais curta que a dos tradicionais, mudando a equação de viabilidade econômica. Como exemplo, pense nas operadoras de telefonia. Por décadas e décadas evoluíram lentamente, oferecendo essencialmente os mesmos serviços. E agora estão em guerra total. Uma nova característica oferecida por uma será imediatamente copiada pelas outras, e a diferenciação competitiva de ontem se torna parte das características básicas de amanhã.
A agilidade e a flexibilidade são agora componentes essenciais da ação estratégica. Identificar ou criar uma oportunidade de negócio exige foco no ambiente em contínua mudança. Os processos internos para criar uma estratégia e elaborar um plano estratégico devem ser revistos para se adequar a ciclos de tempo mais curtos. Por isso, estamos presenciando tantas transformações na área de TI, com novos processos de planejamento e novos ambientes de desenvolvimento, capazes de operar com níveis de agilidade e flexibilidade não disponíveis em um ambiente tradicional.
A concorrência na nova era é condicionada pelo tipo certo de liderança e à capacidade de desenvolver a organização, processos e habilidades para suportar novos níveis requeridos de agilidade e flexibilidade. As organizações tradicionais “pesadas” podem ter dificuldade em se adaptar a esses requisitos. São as pessoas e suas características de liderança e capacidade de inovação que criam a organização “leve” que pode operar no nível certo de agilidade e flexibilidade.
Os novos requisitos de competitividade enfatizam a capacidade de reação rápida em áreas nas quais o desenvolvimento de negócios não pode ser planejado com muita antecedência. Isso leva as empresas a buscar, interna ou externamente, quem quer que tenha o conhecimento ou habilidade necessários prontos para serem fornecidos. Em tais circunstâncias, cada empresa – e cada organização interna de TI – será direcionada a focar em algumas áreas essenciais de atuação, em que atingem altos níveis de excelência, lançando mão de forma oportunista de parceiros internos e externos para formar a combinação certa de recursos para cada iniciativa específica.
O desenvolvimento de modelo de negócios digitais é desenhado para alavancar parceiros em Redes de Processo de Negócios (RPNs) colaborativas, com a alocação dinâmica de recursos de parceiros internos e externos. A solução Vitality (“o programa de recompensa da vida saudável”) da seguradora Prudential mostra uma lista de mais de 20 parceiros que participam e se beneficiam daquele modelo de negócio.
As RPNs abrem novas oportunidades para cada empresa focar naquilo que faz melhor, mas exigem a capacidade de mobilizar e desmobilizar recursos internos e externos muito rapidamente, para participar da criação de um novo modelo de negócio e acrescentar competitividade à rede. O uso de fornecedores internos e externos, além da sua própria TI, é uma tática importante para reduzir o “time to Market” e compartilhar os riscos de mercado.
Os modelos de negócio digital ainda gozam de uma ampla liberdade de ação, sem restrição de leis e regulamentações específicas – e podem permanecer assim, já que eles operam componentes intangíveis, difíceis de serem controlados por governos e órgãos reguladores. Por exemplo, a cobrança de impostos de transações comerciais via Internet é ainda um assunto pendente. Na área de novos modelos financeiros, operadoras como a PayPal (intermediária de transações de pagamento) e a Kickstarter (plataforma global de financiamento coletivo) estão desempenhando atividades que, até recentemente, eram reservadas a bancos sob um rigoroso conjunto de regulamentações do Banco Central. Os pioneiros estabelecem ou influenciam amplamente as regras. Na ausência de regulamentação específica e efetiva, qualquer empresa agora tem a oportunidade de criar algo único e então influenciar as leis que regulamentarão, eventualmente, aquele espaço competitivo específico. Avance primeiro e então trabalhe influenciando a regulamentação.
Os negócios digitais são uma revolução recente, ainda sem ganhadores claros, sem posições de liderança consolidadas, e sem posições fortes de defesa. Isto significa que existem muitos espaços abertos para serem identificados e ocupados; e existem muitos espaços novos a serem imaginados e criados. Mas isso também significa que qualquer modelo criado pode ser facilmente copiado, – como é típico do negócio digital.
Pense, por exemplo, num modelo muito simples de negócio como o de chamar um táxi a partir de um celular. Na maioria das áreas metropolitanas, hoje, existe pelo menos meia dúzia desses modelos de negócio, todos essencialmente iguais. Ou seja, nenhum líder forte é inacessível, nenhuma barreira de proteção é intransponível. Isto transforma os papéis clássicos em inovação. O “primeiro a jogar” pode não permanecer na glória de ter sido o primeiro a ocupar um novo espaço no mercado. É necessário manter-se em contínuo movimento, adicionando diferenciações, que funcionarão como barreira temporária aos seguidores. E o “seguidor oportunista” deve estar preparado para fazer algum dinheiro com muita rapidez – antes que os seguidores não tão rápidos esgotem a oportunidade. Ainda precisamos de mais negócios de taxi pelo celular?
Os modelos de negócios digitais devem fazer sentido, não somente para criar empreendedores, mas em nível corporativo também, pois eles germinam a partir de algumas poucas ideias, mas precisam de cuidados constantes para crescer. O “momento da virada”, muitas vezes, é quando, após terem sido bem-sucedidos como protótipos, eles necessitam ser incrementados para atingir novos clientes. Estes negócios, agora, precisam estar integrados e coordenados com o conjunto dos sistemas básicos da empresa, com o mesmo nível de eficiência, requisitos de segurança e sob os mesmos padrões e arquitetura.
A maioria das empresas terá simultaneamente duas direções para o desenvolvimento de negócio. Uma é a abordagem ágil, flexível, sem hesitações, com vistas à exploração de oportunidades transformadoras no espaço do negócio digital. A outra é o negócio tradicional, que se desenvolverá previsivelmente, evolutivamente.
A existência desses dois modos numa organização de TI – a TI bimodal – já atinge quase 30% das empresas no Brasil. Como implementar essas duas abordagens? No Brasil, as áreas de TI têm geralmente recursos escassos. Muitos CIOs seriam tentados a compartilhar os mesmos recursos entre os dois modos de desenvolvimento – mas isso não funciona. É preciso implementar dois modos claramente distintos de criar soluções. O primeiro é o modo tradicional que conhecemos há décadas. O segundo deve ser implementado com recursos separados, mas não deve ser uma equipe de pessoas ociosas jogando paciência no computador, aguardando que uma oportunidade se apresente. Deve ser um núcleo mínimo de pessoas com talento para a criação de equipes colaborativas. No momento apropriado, elas irão buscar recursos na TI, em outras áreas na empresa ou fora dela, dependendo dos requisitos específicos daquela oportunidade.
Muitas empresas ainda hesitam em se jogar na era do negócio digital. Normalmente, isto ocorre devido a uma combinação de duas razões, sendo que uma reforça a outra. Essa mudança requer um salto radical, e eles não estão seguros de como agir. Mas, isso pode ser conduzido na proporção e no nível de risco que a empresa considerar apropriado, através de células de inovação de negócio independentes (mas não isoladas) dos negócios habituais.
Os líderes do negócio nem sempre possuem uma percepção clara das possibilidades do negócio digital, mas as pessoas e as empresas vão fazer parte deste novo mundo, querendo ou não. Mercados dinâmicos, como varejo, finanças e seguros, já avançam em novos caminhos. E podemos esperar para breve uma explosão nos mercados de educação e serviços de saúde. Em um mundo globalizado, as empresas brasileiras devem reagir aos mesmos fatores que as empresas de países desenvolvidos. Isto significa que, independente de quão favoráveis ou desfavoráveis sejam as nossas condições atuais, as empresas devem iniciar o movimento na direção da nova economia digital.
Sem dúvida, estamos em tempos de definição de uma nova era econômica, o momento em que “vale quase tudo”. A nova era de negócios digitais abre oportunidades inéditas, assim como traz novos riscos. A condição básica é pensar as oportunidades com uma nova cabeça. Há muito espaço aberto pela frente, aguardando por talento e olhar estratégico para tomar posse dele. E o momento é agora.