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*Por Ana Cláudia Donner Abreu 

A educação inteligente, ou smart education, é uma abordagem inovadora que utiliza tecnologias avançadas para tornar o processo educacional mais eficiente, personalizado e acessível (Hong Guo et al., 2021). Esta abordagem está intimamente ligada ao uso estratégico das Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) para melhorar a qualidade do ensino e da aprendizagem.   

Um dos aspectos-chave dessa abordagem é a personalização da aprendizagem, que se utiliza de tecnologias como computação em nuvem, big data, Internet das Coisas (IoT) e Inteligência Artificial (IA) para criar ambientes de aprendizagem inovadores e interativos entre alunos e professores. Essas tecnologias são interdependentes e complementares e promovem uma educação mais inclusiva e acessível, diminuindo barreiras físicas e socioeconômicas. Sua integração pode revolucionar a educação, criando ambientes de aprendizagem dinâmicos e colaborativos que atendem às necessidades individuais dos alunos (Kosala et al., 2022; Hong Guo et al., 2021). 

Um dos pilares centrais da educação inteligente é a conexão de internet, que é necessária para melhorar as competências digitais dos alunos, facilitar a aprendizagem colaborativa e, apoiar práticas pedagógicas inovadoras. Além disso, suporta o desenvolvimento de currículos adaptáveis e a capacitação de professores no uso de ferramentas digitais​. Por essas condições, a conectividade e o uso de tecnologias digitais podem promover a inclusão e equidade educacional, especialmente para alunos com necessidades especiais e em áreas remotas​ (Thimoteau et al,2022; UNESCO,2023).  

No Brasil, o Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br,2024) produz um relatório intitulado “Panorama da Qualidade da Internet nas Escolas Públicas Brasileiras”, que é uma análise detalhada da conectividade nas escolas públicas do Brasil. O relatório elaborado destaca a importância da conectividade como um elemento essencial para a educação inteligente, bem como os desafios enfrentados para alcançar uma cobertura adequada em todas as regiões do país.  

O objetivo principal desse estudo – que se utiliza de dados do Censo Escolar da Educação Básica e do Medidor Educação Conectada para fornecer uma visão abrangente da situação atual no Brasil – é avaliar a qualidade da conectividade nas escolas públicas brasileiras, com foco em três aspectos principais: a presença de internet, a qualidade da conexão e a disponibilidade de equipamentos.    

Vejamos como estão esses aspectos:  

  • Presença de Internet: Em 2023, 89% das escolas públicas declararam ter acesso à internet para uso geral, enquanto 62% tinham internet para fins de aprendizagem. No entanto, apenas 11% das escolas com medidor apresentaram uma velocidade de Internet adequada para as necessidades pedagógicas. Embora a maioria das escolas públicas tenha algum tipo de conexão, a qualidade dessa Internet é frequentemente insuficiente para fins pedagógicos. Isso é particularmente problemático em áreas rurais e remotas, onde a infraestrutura de telecomunicações é mais limitada; 
  • Qualidade da Conexão: A qualidade da conexão, medida em termos de velocidade de download e upload, latência, jitter e perda de pacotes, é crítica para atividades pedagógicas. O estudo destaca que a maioria das escolas ainda não atinge os padrões recomendados de velocidade de conexão por aluno. A velocidade de internet necessária para suportar atividades educacionais ainda não está disponível para a maioria das escolas. A média nacional de velocidade de download por aluno é de apenas 0,26 Mbps, muito abaixo do recomendado de 1 Mbps por aluno. Essa limitação impacta diretamente a capacidade dos alunos de acessar recursos educacionais online e participar de atividades interativas; 
  • Desigualdade Regional: A conectividade varia significativamente entre as regiões do Brasil. As regiões Norte e Nordeste apresentam os maiores desafios, com muitas escolas ainda sem acesso adequado à internet. A disparidade na qualidade da Internet entre as regiões do Brasil é um reflexo das desigualdades socioeconômicas e estruturais do país. As regiões Norte e Nordeste são as mais afetadas, com muitas escolas sem acesso a conexões estáveis e rápidas. Esse problema não é exclusivo do setor educacional, mas também afeta outras áreas, como a saúde e a administração pública.

No Brasil, a desigualdade no acesso à tecnologia e à internet nas escolas públicas é um reflexo das disparidades regionais mais amplas. As regiões Norte e Nordeste, por exemplo, têm menos infraestrutura de telecomunicações, o que dificulta a implementação de conexões de alta qualidade nas escolas. Esse desafio é complexo pela falta de investimentos adequados e pela geografia complexa dessas regiões. Para mitigar essas desigualdades, o governo federal lançou a Estratégia Nacional de Escolas Conectadas, com o objetivo de universalizar a conectividade até 2026.  

Como se observa, a implementação de uma educação inteligente no Brasil enfrenta desafios relacionados à infraestrutura de conexão e seu financiamento. Embora a Estratégia Nacional de Escolas Conectadas seja um passo positivo, a execução eficaz dessa estratégia requer esforços coordenados e investimentos maiores que envolvem:  

  1. Infraestrutura Tecnológica: A infraestrutura de telecomunicações é fundamental para garantir a conectividade nas escolas. Em muitas áreas rurais e remotas, a ausência de redes de alta velocidade impede a implementação de tecnologias educacionais avançadas. Investimentos em infraestrutura, como a expansão de redes de fibra ótica e o aumento da capacidade de banda larga, são essenciais para superar essas barreiras. (UNESCO, 2023)
  2. Financiamento Sustentável: O financiamento é um dos maiores obstáculos para a universalização da conectividade. O governo federal, juntamente com estados e municípios, precisa assegurar recursos suficientes para a manutenção e atualização contínua das tecnologias nas escolas. Parcerias público-privadas podem ser uma solução viável para financiar a expansão da conectividade e a aquisição de equipamentos tecnológicos. (Thimoteau et al., 2022)
  3. Capacitação de Professores: A formação contínua dos professores é necessária para que eles possam utilizar efetivamente as ferramentas digitais em sala de aula. Programas de capacitação devem ser desenvolvidos para capacitar os educadores no uso de plataformas digitais, softwares educacionais e métodos pedagógicos inovadores. (Laurillard, 2012)
  4. Sustentabilidade e Manutenção: Além de implementar novas tecnologias, é fundamental garantir a sustentabilidade e a manutenção dos sistemas existentes. Planos de manutenção preventiva e atualizações regulares devem ser estabelecidos para evitar a obsolescência dos equipamentos e garantir que a tecnologia continue atendendo às necessidades pedagógicas. (Fullan, 2013)

Apesar dos desafios, as oportunidades oferecidas pela educação inteligente no Brasil são promissoras. A conectividade e o uso de tecnologias digitais podem transformar radicalmente o cenário educacional, promovendo uma educação mais inclusiva e equitativa. Algumas das principais oportunidades incluem:  

A personalização do ensino: A tecnologia permite a personalização do ensino, adaptando o conteúdo e os métodos pedagógicos às necessidades individuais dos alunos. Isso pode melhorar significativamente os resultados de aprendizagem e reduzir as taxas de evasão escolar. (Kosala et al., 2022).  

A aprendizagem colaborativa: Plataformas digitais facilitam a aprendizagem colaborativa, permitindo que alunos de diferentes regiões trabalhem juntos em projetos e compartilhem conhecimentos. Isso pode enriquecer a experiência educacional e promover a inclusão social. (Anderson, 2008).  

A inclusão digital: A conectividade pode ajudar a incluir alunos com necessidades especiais, proporcionando-lhes acesso a recursos educacionais adaptados. Ferramentas assistivas e plataformas acessíveis podem garantir que todos os alunos tenham oportunidades iguais de aprendizagem. (UNESCO, 2023).  

O desenvolvimento de competências digitais: A integração das TICs na educação prepara os alunos para o mercado de trabalho do século XXI, desenvolvendo competências digitais essenciais. Isso pode contribuir para a redução das disparidades socioeconômicas e promover o desenvolvimento sustentável do país. (Hong Guo et al., 2021).  

A educação inteligente, fundamentada na conexão digital, oferece um caminho promissor para a transformação do sistema educacional brasileiro. Embora os desafios sejam consideráveis, as oportunidades também são. A universalização da conectividade nas escolas é um objetivo ambicioso, mas essencial para garantir que todos os alunos tenham acesso a uma educação que os prepare para os desafios e oportunidades do futuro digital.  De modo que o Brasil precisa políticas públicas e investimentos contínuos, além da colaboração entre governo, setor privado, sociedade civil e acadêmicos, para alcançar uma educação mais inclusiva, equitativa e de qualidade para todos que assim quiserem.

*Ana Cláudia Donner Abreu é Pesquisadora THINK TANK ABES – IEA/USP e Pesquisadora Sênior do Laboratório de Engenharia da Integração e Governança do Conhecimento do PPGEGC/UFSC. As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, os posicionamentos da Associação.

Aviso: A opinião apresentada neste artigo é de responsabilidade de seu autor e não da ABES – Associação Brasileira das Empresas de Software

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