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Por Rafaela Mancilha, arquiteta de transformação digital da Logicalis

 

O agronegócio é um dos principais setores do Brasil, sendo responsável por quase 25% do PIB (Produto Interno Bruto) de 2017, segundo a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Favorecido pelo clima, que influenciou uma safra recorde de grãos no ano passado, o segmento obteve o maior crescimento dos últimos anos (13,4%) e as expectativas para 2018 não são diferentes.
 
Um dos fatores que deve contribuir para o aumento da representatividade do setor na economia brasileira é o investimento em tecnologia e inovação visando a digitalização do campo, que resulta em produções maiores e redução de perdas. Aspectos fundamentais para enfrentar as margens apertadas com que os produtores operam.
 
Mesmo diante desse cenário de alta, alguns setores têm enfrentado algumas dificuldades. A safra de cana, por exemplo, está caindo pelo terceiro ano consecutivo. Porém, existe um desafio que é inerente a todos os segmentos do agronegócio: a previsibilidade de riscos, cuja falta encarece os seguros e dificulta a obtenção de crédito rural. A tecnologia, além de conferir mais produtividade ao campo, pode facilitar o processo de concessão ao aumentar a base de dados e aprimorar as análises de risco, reduzindo assim, o valor das apólices. 
 
O clima, por exemplo, é uma das informações mais importantes para diversas previsões e análises. No entanto, a malha brasileira de estações meteorológicas é muito limitada e ineficiente, e a falta de dados climatológicas assertivos afeta diversos aspectos do setor rural, como o planejamento e a tomada de decisão do produtor sobre o plantio, tratos culturais e colheita, e, até mesmo, as ofertas e adesões a serviços financeiros, como seguro e crédito rural, devido aos altos preços e à falta de previsibilidade de riscos. 
 
Segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (INMET) temos no Brasil menos de mil estações meteorológicas em todo o território, sendo que apenas 25% apresentam consistência de coleta e histórico de dados. Nos EUA, há mais de 25 mil – embora o país tenha apenas 1.310.000 km² a mais que o nosso. Ou seja, o Brasil representa 87% da área dos EUA, mas tem menos de 5% da quantidade de estações meteorológicas.
 
O número restrito de equipamentos exige que as informações sejam advindas de técnicas de interpolação, o que afeta consideravelmente a precisão desses dados. A falta de qualidade delas fica ainda mais evidente quando analisada a característica tropical do Brasil, repleta de microclimas. As consequências disso são previsões imprecisas que afetam a tomada de decisão dos produtores, provocam tragédias socioambientais – como desmoronamentos -, comprometem o planejamento de tradings e indústrias, e elevam os preços dos serviços financeiros que, por falta de informações de cada produtor ou região, tem sua oferta pautada num modelo problemático, cuja precificação é feita em cima da média.
 
Para se ter uma ideia, no Brasil, menos de 15% do território rural é coberto por algum tipo de seguro, enquanto na China este número corresponde a mais de 65% e é ainda maior nos Estados Unidos, que possui cerca de 85% da produção assegurada. A diferença é extremamente expressiva e o impacto na nossa economia pode ser enorme.
 
Por outro lado, vemos a chegada de seguradoras de outros países no Brasil focadas especificamente nesse setor, tendo como uma das principais exigências, o uso de tecnologia para obtenção de dados e informações assertivas para embasar a análise visando a mitigação dos riscos. Esse movimento pode ser benéfico para os bancos e seguradoras, e também para os produtores, que enfrentam constantemente dificuldades no planejamento das safras.
 
Dentro deste contexto, uma das formas de solucionar a questão é ampliar o número de estações distribuídas pelo País com o intuito de gerar um histórico mais preciso dos diferentes microclimas que existem no Brasil visando ao aprimoramento do setor. Os valores elevados destes equipamentos e a falta de conectividade para coleta de dados representam um desafio aos fornecedores de tecnologia e serviços, que precisam ser criativos para superar essas barreiras.
 
Com estas informações em mãos, as instituições poderão fazer análises mais precisas, mitigando o risco dos seguros e atrelando o pagamento deles aos dados da região. Por exemplo, se choveu mais do que o mínimo para uma produção de cana em um determinado microclima, mas o produtor não conseguiu obter o resultado previsto, a instituição poderá alegar que o impacto veio de fatores internos. Por outro lado, se choveu menos do que o necessário, o produtor não pode ser penalizado pela queda na produção e receberá integralmente o seguro contratado.
 
A tecnologia pode suportar também um maior desenvolvimento do setor como um todo, ao entregar às instituições que asseguram as plantações, dados específicos da região ou de uma determinada cultura e, conforme esse histórico for crescendo, será possível fazer previsões ainda mais assertivas e oferecer, inclusive, seguros mais baratos. Além disso, as instituições poderão oferecer serviços adicionais aos produtores, como informações de microclima, controle de peste, manejo de lavoura, entre outros, aumentando assim o valor agregado de suas ofertas – tudo com base na tecnologia -, acelerando a digitalização e a produtividade no campo.
 
As informações de microclima ajudarão também os produtores, principalmente se levarmos em consideração que a mudança climática é um dos fatores que mais impacta no resultado das safras e leva à quebra de produtores. Isso porque, muitos deles pegam o crédito para dar início à plantação e, se algo não sai como o esperado, não conseguem pagar o banco e acabam quebrando ou entrando em recuperação judicial.
 
Além disso, com os dados obtidos por meio da tecnologia, o produtor conseguirá tomar outras decisões em relação ao processo de produção, identificando a melhor data para o plantio e a colheita com base no histórico da região em que está instalado. O conhecimento dessas informações pode contribuir, inclusive, com decisões relacionadas à aplicação de defensivos agrícolas, uma vez que a condição climatológica influencia na proliferação de determinadas pragas.
 
Hoje, os produtores só conseguem identificar a proliferação delas de forma manual e presencial, ou seja, caminhando pela plantação. E ainda assim precisam ter sorte de passar no lugar exato em que a praga está para identifica-la. Porém, conhecendo o histórico da região e acompanhando a evolução do clima por meio da tecnologia, será possível determinar a aplicação de um defensivo antecipadamente, por exemplo, minimizando perdas.
 
A tecnologia pode elevar a produtividade no campo a outro patamar, aumentando ainda mais a representatividade do setor na economia brasileira ao possibilitar um melhor controle da produção e uma previsão de retorno mais assertiva sobre a colheita, mitigando riscos com antecedência. E, com a redução do valor dos seguros, acredito que haverá um aumento no percentual de plantações asseguradas. Porém, os benefícios não param por aí. Tenho certeza de que a tecnologia terá ainda um papel social ao ajudar os produtores não só a manterem suas produções, mas também a aumentarem o retorno delas, impulsionando assim, a prosperidade do segmento e também do País.

 Aviso: A opinião apresentada neste artigo é de responsabilidade de seu autor e não da ABES – Associação Brasileira das Empresas de Software

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